Das Lendas Que Não Existem IV
- Welington Moraes
- 8 de abr. de 2015
- 2 min de leitura
No país dos bobocas se alastrou uma doença boba como eles, A cada riso que um boboca proferia, Três outros patrícios riam juntos. Então na Bobocalândia só o que se ouvia eram risadas. Isso se tornou um problema, Ninguém mais se entendia, Ninguém mais conversava, Ninguém mais agüentava o som de tanta galhardia. O boboca chefe, Que já sofria da doença antes mesmo do contágio, Orgulhava-se de comandar um país tão alegre. Mas lá no fundão da cidade vivia um velho que não se importava em ser confundido com um boboca, Poucos sabiam, E outros fingiam não perceber, Que ele nunca fora um filho legitimo dessa nação, Ele nascera longe dali, Num país onde a sapiência reinava, Mas resolvera naquele país morar por tentar usufruir da água da região, Uma água mágica e apaixonante, Que secava a boca só de lembrar, Tamanha a vontade de possuí-la. Mas o velho sentia-se incomodado com a tal doença. Decidiu por si só descobrir a cura, Juntou uns papéis velhos, Um tinteiro de pena de pavão e uma colher, Pois sem colher nesse mundo não se vive, E partiu em sua jornada insólita. Antes de sair da cidade gritou a todos os pulmões: “Irei trazer a cura para vocês, seus bobocas!” Mas só o que ouviu de volta foi o som de gargalhadas. Durante um bom tempo não se ouviu mais falar do ancião. Num dado tempo, Onde o sol, por estar entediado, resolvera brincar de esconder com a lua, Apareceu na Bobocalândia um viajante das brisas chamado Abimael. Chegara atraído por tamanha felicidade que trasbordava pelos muros da cidade, E iria parar perto do caminho que levava a lugar nenhum. Abimael trazia consigo o conhecimento de quem se move. A esse momento o chefe dos bobocas não sentia mais tanto orgulho de sua nação, Sorrir era um fardo muito pesado, Deveria ser usado com maestria, Somente nos momentos de extrema sensibilidade, Nunca tirara de sua mente o velório de sua mãe, Regado a flores e gargalhadas, Um insulto que ele jurou não mais esquecer. Abimael viu ali sua chance de tornar-se único. Junto das tralhas que trazia, Abimael guardava um pedaço de pergaminho com palavras que podiam ser usadas para curar qualquer coisa. A ler tais palavras o riso cessou. O rei, extasiado com tal perfeição persuasiva, Ofereceu o céu de Bobocolândia a Abimael, Esse por sua vez recusou tal presente, Queria mesmo era ter o domínio da fonte que provia água a cidade. Assim foi feito. Hoje os bobocas vivem em total harmonia, Mas bebem pouca água, Abimael tem seus escolhidos e só a eles oferece tal dádiva, Nunca mais se viu uma só gota de alegria. Quanto ao velho, esse nunca mais voltou. Dizem que descobriu por si só a produzir água, Igual aquela de Bobocolândia, E vive de saciar os povos por onde passa.

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