
Sinopses, cartazes e fragmentos de textos teatrais.

As Camélias (Peça apresentada em 2013).
O retrato do cotidiano, amarguras da vida, decepções, desejos reclusos, ânsia em mudar...
Tudo representado por três mulheres e emoldurado pelo realismo fantástico de um quadro cênico. O vazio da existência, refletido na aleatoriedade dos diálogos, demonstra sentimentos inerentes a todos nós.
Três Camélias, sem nomes próprios, identificadas apenas por sofrimentos passados, decidem mudar de vida e o lugar escolhido para o início dessa mudança é uma estação de trem.
Assim elas se conhecem a espera de um objeto desejado, dando início a um longo diálogo sobre a vida e seus pormenores, despertando curiosidades e desconfianças.
Dramaturgia e Direção: Welington Moraes.
Elenco: Eliane Ventura, Juliana Aguiar, Taaly Segatti e Welington Moraes.
Participação Especial: Guilherme Moraes, Lud Quaresma e Eduardo Neves.
Fragmento do texto:
SEGUNDO ATO
Uma estação de trem, onde no centro há três poltronas. Ao fundo há um relógio sem ponteiros.
CENA ÚNICA
Camélia 1, Camélia 2, Camélia 3, um jovem bilheteiro e um outro jovem
CAMÉLIA 3
Chega pela esquerda, com um tíquete de passagem na mão e a mala na outra. Olha em volta, indecisa, olha na direção de onde veio, fica pensativa por alguns instantes. Balança a cabeça negativamente, deixa a mala no proscênio e senta na poltrona da direita.
CAMÉLIA 2
Chega pela direita, com um tíquete de passagem na mão e a mala na outra. Olha em volta, segura de si. Passa um jovem bilheteiro e ela o encara. Ele fica envergonhado e abaixa a cabeça. Ela sorri satisfeita, deixa a mala no proscênio e senta na poltrona da esquerda.
CAMÉLIA 1
Chega pelo centro da platéia, com um tíquete de passagem na mão e a mala na outra. Olha em volta, como que procurando alguém. Olha fixamente para as duas Camélias sentadas nas poltronas, deixa a mala no proscênio e senta na poltrona do centro.
Suspirando:
Agora é só esperar... (olha para a Camélia 2) Será que este trem demora? Já esperei muito na vida, mas agora estou um pouco sem paciência.
CAMÉLIA 2
Imponente:
Demora... Mas hoje ele vem, tenho certeza. Eu conheço o maquinista e ele é um pouco demorado nas coisas, mas sempre chega. (pensativa) Há não ser num dia que ele... Ah, deixa para lá. (olha para a Camélia 3) Afinal acontece com todos, mais cedo ou mais tarde, não é?
CAMÉLIA 3
Está com o pensamento longe, sem prestar atenção nas outras duas.
Avoada:
Ahm... Acho que sim... Mas vocês sabem me dizer se este trem demora?
CAMÉLIA 1 E CAMÉLIA 2
Entreolham-se.
Juntas, rindo:
Demora!
CAMÉLIA 2
Decidida:
Mas ele vem, tenho certeza! (olha em volta) Esse negócio de estação de trem é engraçado, né? As pessoas vêm e vão, até parece com a vida... Apesar de ter sempre pessoas indo embora a estação nunca fica vazia, porque sempre tem alguém chegando. Eu por exemplo, estou indo embora, mas em quantas estações de trem nesta vida que eu já cheguei, algumas sem nem saber onde ia ficar, e agora estou aqui pronta para partir.
CAMÉLIA 3
Desiludida:
Às vezes a vontade que tenho é partir para nunca mais voltar! Em todas as estações que cheguei o trem já havia partido, restando somente eu. Se a vida é uma estação de trem a minha está desativada há muito tempo, devido a muitos descarrilamentos...
CAMÉLIA 1
Pensativa:
Já a minha foi usada por um único trem. Ele ia embora, sem dar nenhum sinal. Tempos depois voltava como se nada tivesse acontecido... Como a gente demora a acordar nesta vida!
CAMÉLIA 3
Melancólica:
Algumas pessoas nem acordam. Passam pela vida como se ela fosse um sonho.
CAMÉLIA 1
Tristonha:
Quem me dera... A minha teve mais momentos de pesadelo do que sonhos. Há quanto tempo que não sei o que é sonhar, ser feliz. Mas agora tenho em mãos o inicio de uma nova vida (levanta o tíquete), e só esperar chegar o trem.
Manequim (Primeira vez apresentada em 2010)
Um homem e seu amor a um manequim.
A solidão deixa transparecer a loucura e a loucura pode matar.

Fragmento do texto:
CENA 1
Abre foco no sofá onde se encontra um manequim feminino. O foco acompanha a música, ao final, junto de um trovão entra o homem, capa de chuva, sob a capa está bem vestido.
HOMEM: Que aguaceiro! Parece que alguém lá de cima esqueceu de fechar a torneira. (Beija a manequim) Boa noite, como foi seu dia? O meu foi uma loucura, com essa chuva o trânsito está infernal. As pessoas estão cada vez mais solitárias. Presas em seus casulos ficam a maquinar a próxima maldade, o próximo desrespeito, ninguém mais se cumprimenta, se abraça, ninguém mais ama. Ainda mais com esse louco a solta pela cidade, li no jornal que já são três vitimas, três lindas mulheres. Dizem que ele sufoca as vitimas com um saco plástico. Enquanto fica a olhar para elas se debatendo, será que ele sorri ou fica triste? Quem vai saber... Fez comida? (Olha em direção a cozinha) Não? Deixa... Eu peço uma pizza aqui da frente, é rapidinho. (Pegando o telefone) Eu vou pedir aquela que você adora, e de quebra uma garrafa de absinto só para acalmar. Alô, oi seu Alberto é o seu vizinho aqui da frente, seu cliente numero um. Eu gostaria de pedir a pizza de sempre e uma garrafa de absinto. Qual a marca? Pode ser esse mesmo. OK! Obrigado. (Para a manequim) Agora é só esperar... Eu estava com saudades, não via a hora de estar aqui, com você, no nosso apartamento. Eu estou tão feliz, acho que é você... Esse seu jeito... Tão tranqüila... Serena... Silenciosa... Mas eu me sinto tão calmo ao seu lado. Eu poderia gritar que sou o homem mais feliz desse mundo. Poderia não, eu vou gritar: EU SOU O HOMEM MAIS FELIZ DESSE MUNDO! (Sorrindo) A vida é tão mais bela quando estou aqui, (sinistro) diferente lá de fora... Lá e tão vermelho... Sombrio... Doloroso. (Entra música)

Pensar (teatro de rua)
O pensamento está proibido.
Despertos pensantes subvertem a falsa ordem de um regime distópico, incitando a crítica e disseminado como um vírus o exercício do livre pensar.
Fragmento do texto:
Cena 1
Cenário: Prisão - Uma gaiola em plena rua. Dentro dela há grilhões presos ao chão.
(Telão mostra o seguinte texto: "Kane (antiga Florianópolis), 1º de outubro de 2512". Dentro da gaiola há um homem preso aos grilhões, aparência de debilitado e seminu.)
Homem: (gritando) O que eu tô fazendo aqui? Por favor, alguém me ajuda! Eu tô com fome, eu vou morrer aqui... Eu não posso morrer tão entendendo? Eu preciso ver alguém, eu preciso conversar com alguém, (chorando) eu preciso ser alguém... Eu nunca quis ser diferente, eu nasci assim!
(Música “A Cavalgada das Valquírias” de Wagner. Durante a música entram os guardas, todos com as mesmas roupas e com uma mesma máscara, numa cor sombria e sem personalidade, e começam a torturar o preso. Ao fim da música entra o “comandante” usa as mesmas roupas dos guardas, a mesma máscara, a única coisa que o difere é um símbolo em seu antebraço. Num gesto austero, ordena que os guardas se retirem, após verificar se está realmente sozinho, retira a máscara, demonstrando ser uma mulher.)
Comandante: (Sarcástica) Você não percebeu que não adianta gritar? Quanto mais você grita, mais apanha. Deve ser esta maldita personalidade! Ser alguém, e quem disse que você tem o direito de ser alguém? Aqui sobre os meus domínios, o pensamento pode matar. (Gargalha) Mas sabe que eu me divirto com você? Tão patético...
Homem: Por favor, me dá alguma coisa para comer, eu tô faminto...
Comandante: É tão fácil dominar vocês, “Panis at circenses”.
(Retira um pão do bolso e joga no chão. O homem devora o pão feito um animal.)
Comandante: Às vezes eu sinto até um pouco de pena, mas logo depois passa. Agora eu quero saber: quem lhe ensinou a pensar?
Homem: (Engasgando por comer tão depressa) Ninguém me ensinou, eu nasci assim.
Comandante: Não me faça perder a paciência! Eu sei que vocês foram instruídos a dar esta resposta. Saiba que os outros não resistiram tanto quanto você. Agora irei repetir: quem lhe ensinou a pensar?
Homem: Você diz que eu sou patético, porem se esquece de olhar pra si próprio. O pensamento é livre, ele surge onde menos se espera, é um paiol prestes a explodir e é só preciso uma fagulha.
Comandante: Serei obrigado a usar de métodos mais ordotoxos.
(Retira do bolso um aparelho com um botão, o aperta. Recoloca a máscara. Logo após entram alguns guardas, um com uma TV, que a coloca na frente do homem. Os outros guardas pegam o homem e lhe colam as pálpebras de modo que os olhos fiquem arregalados. Saem os guardas. Inicia-se uma seqüencia de imagens. Homem se debate por alguns minutos até deixar-se ficar mesmerizado pelas imagens. Comandante ri.)
Black-out
Uma história de amor em ato único (texto em andamento)
A vida e o teatro se confundem nessa história de amor entre Eduardo e Mônica, que se mostra eterna até o fim do único ato da peça.

Fragmento do texto:
Música. O espaço vai se desconstruindo, ficando somente a cama. A história de amor desse casal será agora contada. Chegam cada um de um lado. A cama, agora sem a parede, será o ponto de inicio.
ATRIZ
Conversa com alguem que a platéia não vê.
Eu estou precisando mesmo é de uma cama. Acabei de chegar aqui, passei no vestibular. Sabe, o apartamento que eu aluguei é...
ATOR
Conversa com alguém que a platéia não vê.
...apertado cara, precisa ver como era apertado. Parecia virgem. Eu quase achei que iria precisar...
ATRIZ
...passar um óleo ou qualquer outra coisa que destrancasse a fechadura. Sabe como é, apartamento velho, achei que ficaria presa, achei que eu ia ficar...
ATOR
...brocha. Não conseguia me concentrar. Foi tão dificil que eu quase fiquei...
ATRIZ
...brocha. Brocha, pincel, tinta... Tudo isso eu preciso comprar ainda. Sabe como é, eu preciso...
ATOR
...dar uma pintada, cara. Antes que eu me forme, antes de sair daquela faculdade, eu tô muito necessitado. Na verdade o que eu preciso é...
ATOR e ATRIZ
Juntos.
...comprar uma cama.
No decorrer do diálogo eles aproximavam cada vez mais do centro do palco. Nessa última frase eles a falam pulando em cima da cama. Se olham. Ficam sem graça por um tempo, até desatarem numa gargalhada.
ATOR
Prazer, meu nome é Eduardo.
ATRIZ
Ainda rindo.
Como a música...
EDUARDO
Como...
ATRIZ
É que meu nome é Mônica, prazer.
EDUARDO
Eduardo e Mônica, se eu contar ninguém acredita...
MÔNICA
È parece até ficção.
EDUARDO
Aqui a ficção toma forma na cabeça de quem vê. Basta acreditar que é real, assim se torna.
MÔNICA
Até o amor?
EDUARDO
Até o amor. Nunca ouviu falar de Romeu e Julieta? Anfitrião e Alcmena? Paris e Helena? Todos eles juraram amor eterno aqui mesmo onde estamos.
MÔNICA
Nesta loja de móveis...
EDUARDO
Não... Você sabe onde...
Olha em volta
Aqui.
MÔNICA
Rindo.
Eu sei. É aqui que tudo começa. Uma história de amor em ato único...
EDUARDO
Uma história de amor em ato único, taí... Gostei! Quem sabe eu escreva algo com esse título. O amor improvável entre Eduardo e Mônica, com começo, meio e fim...
MÔNICA
Fim?
EDUARDO
Tudo acaba, até o amor. Mas não agora. Vamos deixar a vida acontecer, a peça continuar e o amor surgir...
MÔNICA
Você promete me amar até o fim desse ato?
EDUARDO
Prometo. Que seja eterno até o apagar das luzes, o descer do pano e quando os aplausos começarem saberemos então que valeu a pena.
MÔNICA
O amor ou a peça?
EDUARDO
Os dois.
Se beijam. Música. As luzes mudam.
O Taxidermista (texto em andamento)
A história de um homem e seu amor pela morte.
Fragmento do texto:
CENA ÚNICA
TAXIDERMISTA
Trabalho com mortos, eles incomodam menos. São seres vivos como todos os outros, digo, são seres mortos como todos os outros. Tudo morre. A única diferença para quando vivos, é que mexem menos. Eles fedem mais também. Mas aí já são duas diferenças além de uma única. Mexem menos e fedem mais. Ah! Ficam um pouco mais rígidos também. Envelhecer é caminhar para o vale do endurecimento corporal onde a morte solidifica o que é vivo e o tempo liquidifica o que é belo. Nada é para sempre. Só a morte. Hoje já me acostumei a viver entre os mortos, já que meu dia chegará e morrerei entre os vivos. Mas nem sempre foi assim. Herdei essa profissão de meu pai, que por sua vez a herdou de meu avô, que por sua vez a herdou de um caixeiro viajente a qual matou de passagem por sua casa. O tal caixeiro tinha como profissão primária a taxidermia. Do grego taxis que significa ordenar e derme que significa pele. Sou um ordenador de peles, um alfaiate post mortem, um deus as avessas, que faz da morte a sua criação. Sou o alfa de inúmeros omegas, sou o começo para todo o fim. Bom, deixem-me contar como a profissão entrou em minha família...
Música. O Taxidermista afasta a mesa de trabalho. No decorrer da sua contação, vai interpretando a história. Pode usar de simples adereços (malas, chapéus, etc) para representar os personagens da história.
Terror Sagrado (Experimentação com fragmentos de Hamlet)
Monólogo de um ator Shakespeareano, onde ator e personagem se confundem.
Fragmento do texto:
A luz vai acendendo lentamente em consonância com o OFF. Assim vemos o cenário, que basicamente é um camarim de teatro, onde a posição do espelho faz com que o ATOR - sentado de frente para ele - fique de costas para o público. Destacado em algum lugar da parede desse camarim, um cartaz com a foto do ATOR caracterizado de personagem, onde se lê: HAMLET - O Princípe da Dinamarca.
OFF. (FORTIMBRÁS)
Sejam por quatro capitães levados os restos mortaes de Hamlet: façam-se-lhe todas as honras militares. Se vivesse teria sido um grande rei. Quando passar, salvem os canhões. Levem os cadaveres, esta vista é só propria dos campos de batalha; aqui causa horror! Executem as minhas ordens, rompam as salvas de canhões e as descargas de fuzilaria, e as marchas funebres. Morreu o que havia de ser rei de Dinamarca.
Sons de aplausos eufóricos, gritos de bravo!, etc. Em contraponto entra o ATOR, camisa branca manchada de sangue, passos pesarosos, como se o mundo lhe pesasse as costas, rosto baixo e extremamente suado. Senta de frente ao espelho. Há uma camera enquadrada no rosto do ator. A imagem é projetada num telão ao fundo do palco.
ATOR
O resto... é... silencio...
Começa a limpar o suor e retirar toda a maquiagem. A ação remete a um ritual solene. Levanta-se e retira a camisa manchada de sangue de costas para o público. Pendura-a numa arara. Começa a tocar um celular com um toque que cause certo desconforto e seja totalmente contrastante com toda a cena. Ator volta a sentar. Atende.
ATOR
Alô... Oi. Tava lotado. Acho que gostaram, aplaudiram de pé. Sim, eu vou depositar amanhã. É... é... sem falta... amanhã pela manhã. Como ela tá? Deve ser virose, esse tempo maluco sempre mudando... Olha... eu... é... preciso desligar, daqui a pouco começa a segunda sessão. Tá... sem falta... amanhã eu deposito...
Olha-se no espelho.
Ah! porque não poderá esta carne tão solida fundir-se e tornar-se orvalho. são insipidos, fastidiosos e vãos os gosos do mundo. Que pena! Fragilidade é synonymo de mulher!
Levanta-se. E fala a plateia, alucinado. Fala em tom de confidência.
Só um mez, banhada em lagrimas como uma Niobe, ella mesma, essa mulher, oh céus! um animal. No fim de um mez, antes que seccassem as suas hypocritas lagrimas, casou. Oh criminosa precipitação! Voar com tanto afan a um leito é horrivel! E será possivel que o céu a tolere? Despedaça-te coração, já que forçoso é calar.
Volta a si, percebe o seu estado.
O que tá acontecendo comigo? Por que com minha raiva saem palavras dele?
Olha no espelho.
Quem eu realmente sou?